terça-feira, 29 de julho de 2014
morrer antes
os bons morrem antes
antes de quê, me pergunto
antes de mim, antes de nós
antes do mundo deixar
a gente ficar junto
só pra puxar assunto
alguma coisa me diz
há uma parede de vidro
que me impede tocar
os bons que morrem
antes de pensar em tocá-los
meus heróis não existem
meus deuses de papel
são crianças de colo
em que precipício me atiro
que encruzilhada jogar-me
o meu sangue tem seu charme
e em meu peito há sempre
um último suspiro
ontem eu tive certeza
de que não sou lá essas coisas
porque finalmente estava sóbrio
ao meu redor vinte cigarros mortos
escrevo pra deus
ou qualquer face que ele tenha
peço que me ensine a ser bom
pra que, como eles
eu possa morrer antes
até hoje
nunca fui bom o bastante
pra poder morrer antes
sábado, 5 de julho de 2014
abre-me a tua casa
abre-me a tua casa. lança-me teus braços em cordas de salvamento. que os espinhos do teu caule me sangrem, se for preciso, mas nunca como antes sangraram o menino que fui. deixa que te envolva em meus braços de homem, e que eu possa te dar a segurança de que preciso. o futuro se encarregará de nós como um barco, desde que o rememos. que eu sinta a tinta de teus cabelos entre meus dedos, campos de trigo às quatro da tarde. que o vermelho de meus lábios deixe manchas indeléveis sobre cada parte de teu corpo. que as sombras em tua memória te sejam sempre de vidro, e os filhos de nosso presente, diamantes. peço-te, ordeno-te, que fiques sempre ao meu lado. não temos mais que nos esconder. eu não tenho planos de fuga e já não és mais labirinto, mas mistério a ser desvendado. que nosso mar seja calmo, ainda que eu saiba das ondas que tens nas madrugadas nubladas. por fim, que estejamos sempre caminhando ao pôr-do-sol, com a primavera entre os dentes.
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